domingo, 13 de janeiro de 2019

PROSEANDO & PROVANDO DE POESIA

A PIPA

DESPEDIU-SE DE MIM E PARTIU ALTIVA E ORGULHOSA,
DE DESDENHAR O MEU AMOR E, SEGUIU SEM OLHAR PARA TRÁS.
IMÓVEL, PERMANECI, SENTINDO NO PEITO UMA DOR ATROZ,
DE PERDER O QUE JUGAVA PERENE E, NUNCA, FUGAZ.

POR UM TEMPO SEM FIM, FIZ-ME, PEDRA MILENAR
E, PERMANECI, À BEIRA DA ESTRADA, COBERTA DE MUSGOS.
EM MIM, AS AVES POUSAVAM, PARA, DA JORNADA, DESCANSAR
E, SEM RELUTÂNCIA BEBIAM AS LÁGRIMAS DO MEU CHORO.

UMA TARDE SAÍ DO OSTRACISMO E VOLTEI À VIDA
SACUDI DO CORPO, AS POEIRAS FÉTIDAS E VISGUENTAS.
NUM IMPULSO HERCÚLEO, CAMINHEI TENDO A ALMA DORIDA
PARA O NINHO QUE NOS RECEBIA... TINHA A GARGANTA SEDENTA.

ASSIM QUE ADENTREI NO RECINTO, ONDE OUTRORA FORA FELIZ,
SENTI NO AR, O PERFUME DO SEU LINDO CORPO ME ENVOLVER.
AGONIADO, DEIXEI-ME CAIR NO LEITO COBERTO DE CETIM
E, PERMITI À ALMA SAIR DO CORPO... NÃO QUERIA MAIS VIVER.

NO CRIADO MUDO A GAVETA ABERTA, OLHAVA PARA MIM,
COMO SE QUISESSE DIZER-ME ALGO, OU, ALGO ME CONFESSAR,
NUM ESPASMO DOLOROSO PERSCRUTEI-A E FUI FELIZ,
AO CONTEMPLAR OS BILHETES QUE EXPRESSAVAM O NOSSO MUITO AMAR.


POR TRÊS DIAS E NOITES LI-OS, TENDO OS OLHOS EMBAÇADOS
DE TANTO CHORAR AS LEMBRANÇAS DE QUANDO ERA CRÉDULO
NO AMOR, QUE ELA, JURAVA DAR-ME ENTRE BEIJOS APAIXONADOS
E CARÍCIAS MIL. AH, SEMPRE FUI UM TOLO... UM CARENTE CEGO.

COMO DESTRUIR OS BILHETES, ONDE EXPUS OS MEUS SENTIMENTOS?
ODIAVA-OS POR SEREM TESTEMUNHAS DA MULHER INÍQUA.
PENSEI EM QUEIMÁ-LOS E FAZÊ-LOS EM ÍNFIMOS FRAGMENTOS
AH, PENSEI: MELHOR TRANSFORMÁ-LOS EM UMA FOLHA DE PIPA.

E, ASSIM, O FIZ, COM METICULOSOS E TRÊMULOS GESTOS,
COLEI-OS UM A UM, FORMANDO UMA FOLHA QUADRICULADA.
COM AS VARETAS CONSTRUÍ O MEU TRISTE OBJETO
E, O ALCEI AOS CÉUS, AO CONTATO DAS NUVENS DENSAS E ALVAS.

EM INSTANTES, FORMOU-SE UMA TEMPESTADE FEIA, VESPERTINA,
RISCADAS POR RAIOS LUZENTES AS NUVENS CHORARAM
E, AS LÁGRIMAS, CAÍRAM IMPIEDOSAS SOBRE A INTRIGANTE PIPA,
QUE, GEMENTE, SOLTOU OS BILHETES, QUE, PELOS ARES, ESVOAÇARAM.

NUM ÁTIMO GRUDOU-SE NO MEU ROSTO UM ROTO RETALHO
DO EMARANHADO DE BILHETES QUE FORMAVAM O ENIGMA
DE UMA HISTÓRIA DE AMO, O MEU DESTINO, O MEU SUDÁRIO.
ASSIM, POR UMA TARDE, REVIVI O AMOR NUMA DILACERADA PIPA.



NUM GESTO BRUSCO RETIREI O FRAGMENTO MOLHADO
QUE UM DIA, NELE ESCREVI A FRASE: MUITO AMEI...
AS LETRAS DISFORMES FORMAVAM UM INCRÍVEL RABISCADO:
TRISTE, TRÊMULO, PUDE LER – ADEUS, NUNCA TE AMEI.

UM DIA, UMA TARDE, UMA PIPA... UM ADEUS!
CARAGUÁ, 28-12-18
A LUA ACABOU DE SE BANHAR NO MAR À MINHA FRENTE.





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