terça-feira, 9 de dezembro de 2014
O GATO RAJADO!
O gato rajado vivia soturnamente sobre os telhados do casarão da Coletoria Estadual da Vila de Palmares. Invariavelmente, assim que o sol se punha ele miando preguiçosamente atravessava a praça numa carreira desengonçada (era capenga) e pulando alguns muros e telhados de casas não famosas, chegava em seu destino e lá se punha a espreguiçar pachorramente. A Lua sempre o pegava alisando os bigodes nas telhas impregnadas de musgo. Nunca esboçou um mínimo sequer de estres, aliás, era dentre os felinos da pequena cidade o mais bonachão e desligado da vida. O seu dia a dia se constituia em perambular pelos becos e vielas atrás de alguma gata mais vadia ou, então, atrás de um pardal mais desavisado. Inúmeras vezes teve sucesso, pois, além de hábil namorador era também um hábil caçador. De tudo o que fazia para prencher o tempo, tinha sempre os olhos voltados para dois primos chatos e metidos a valentes que viviam a importuná-lo. A última vez que isto aconteceu foi numa tarde, na festa do Divino, quando ele tinha acabado de devorar um tico-tico e de barriga cheia se postou frente ao coreto num telhado de casa pequena3e, sem mais nem menos os "idiotas" chegaram e se arremessaram sobre ele. Pego de surpresa, não pôde esboçar a reação que pretendia e por isso levou umas mordidas, mas, sem antes, deixar a marca de suas unhas nas costas de um deles. Rajado que era, sempre se camuflou nas sombras da noite. Quando a noite chegava negra, sem Lua, ele sabia ter chegado a sua hora de conquistar umas fêmeas apetitosas. Assim, aconteceu, numa noite tenebrosa de Julho. As nuvens pretas e fantasmagóricas dançavam, quais odaliscas, pelo séu da bucólica cidadezinha. Os humanos, medrosos se recolheram em suas casas e acenderam as palmas bentas e rezaram temendo a tempestade que se anunciava. No cimo do casarão da Prefeitura uma coruja piou desconsoladamente. No cemitério, próximo à rua do Cortiço, os portões batiam soltando uivos amedrontadores. Podia se dizer sem medo de errar que estava se anunciando uma noite tétrica. Mas, nada que amedrontasse o gato rajado. Lá pelas tantas da madrugada, quando os ventos uivavam na torre da Igreja, ele, vislumbrou a fêmea que por vários dias e noites a estava paquerando. Sem perda de tempo e, com alguns saltos graciosos, chegou até ela, que estava acomodada no telhado do sobrado da Maria Cótinha. Entre miados e rosnados, realizou o seu sonho: Copulou por muitas vezes até que o Sol apareceu atrás do morro da cangalha. Satisfeito, retornou para o seu abrigo; uma saliência entre dois muros que circundavam o Mercado Municipal. Aí, permaneceu até o cair da tarde. A noite chegou, e, o gato rajado, agora saciado de sexo e amor saiu para o seu passeio vespertino até que...
Até que encontrou com os seus dois desafetos e tomado de coragem achou que era o momento certo para mostrar quem que realmente mandava no pedaço. Num ímpeto impensado se atirou sobre os dois e travou uma luta desigual, porém, magnânima. Entre miados, rosnados e uivos estridentes os combatentes lutaram como bestas; como feras possessas. Após alguns minutos a bela gata possuída que foi pelo gato rajado chegou até a arena e se pôs ao lado do seu galante com os dentes e as unhas postas, portando-se não como uma gata delicada, mas sim, como uma tigresa. Agora, com ela ao seu lado o gato rajado buscou forças onde não mais tinha e com duas mordidas e algumas unhadas derrotou os seus contendores, que, arrastando as patas e com os rabos dentre as pernas pularam pelos casarões numa fuga frenética. Juntos, o gato rajado e sua heroína, foram se refestelar no quintal da pensão do Nonô, que devido aos restos de comida que eram atirados no terreiro, ajuntava deliciosos e suculentos pardais. O tempo passou e, após noites de intenso amor nos telhados dos casarões seculares a pequena cidade viu aumentada a população de felinos com uma ninhada de oito gatinhos e, pasmem, todos rajados.
Se alguém quiser contemplá-los é só ir até a cidade de Vila dos Palmares e à noite, em frente da coletoria estadual, se posicionar e esperar a Lua surgir que o gato rajado, sua querida dondoca e seus rebentos sairão para um passeio noturno.
A Vila dos Palmares fica...
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