quinta-feira, 27 de outubro de 2016

O ROSÁRIO DE MADREPÉROLA!

O rosário de madrepérola entrelaçado nos finos dedos
Da devota senhora que se ajoelhou frente ao altar,
Da Virgem Maria que afagava o Menino Jesus no colo,
Causou-me um fremito no corpo e, logo, me pus, a desejar.

Tinha o sagrado objeto as contas reluzentes e imaculadas,
Formando o "Todo" que balançava em místicos circulos sagrados.
De onde eu estava podia observar o palor das faces pálidas,
E, o coração, num frenético pulsar sofrido; descompassado.

Por algum tempo ela fora rejeitada pelas mulheres hipócritas,
Que desdenhavam a vida dupla, que levava, na rígida comunidade.
Durante o dia, era a senhora sisuda, fiel, às sagradas escrituras,

Porém, quando a Lua surgia dentre as nuvens que pairavam sorrateiras,
Ela, trocava o rosário de madrepérola pelas horas de infidelidade.
Na missa ou, na noite, eu, sempre a desejei: ora, amante! ora,freira!



sexta-feira, 21 de outubro de 2016

NADA! NADA! NADA!.. NADAAAAAAAAAA!, OU, TUDO! TUDO! TUDO!... TUDOOOOOO!

Nada! Nada! Nada!
É o que sinto nesse momento de intenso e causticante vazio em meu cérebro.
Já estou por horas ou, quem sabe, séculos, enclausurado numa concha pétrea.
Não sinto vontade de viver, sim, de viver, essa vida estéril, em que me encontro.
Quero tudo e, não quero, NADAAA!
Sou a fumaça que se desprende do lenho que agoniza envolto pelas labaredas;
Sou a areia que muda de lugar a cada instante, sem um lar que possa estacionar.
Por mim passa um rio e, nem eu, nem ninguém, NADA!
Verte dos meus olhos uma cachoeira de um pó pegajoso e fétido e, nela, ninguém, NADA!
Às vezes ainda sinto um gotejar viscoso no coração que há muito deixou de pulsar.
Vivo a vida vazia de aspirações, porém, repleta, intumescida de NADA!
Nada-se para não chegar a lugar algum e, se chega a algum lugar, só se encontra o NADA!
Uma aranha medonha passou por sobre os meus pés e, senti, NADA!
Arre, cheguei ao oceano das minhas misérias e nele penso que vou me banhar, mas, NADA!
Por fim, vejo-me, num terreno áspero, infértil e pedregoso e nele, vejo cruzes enegrecidas...TUDO!
Sim, acabei de chegar em minha última morada; a morada dos que nunca sentiram NADA!
Enfim, quando encontro o TUDO, sei que estou sendo bem recebido pelos vermes e, mais, NADA!
Viver quando o NADA é TUDO e o TUDO é NADA!

terça-feira, 18 de outubro de 2016

A BRASA REAVIVADA!

Engana-se quem acredita que uma brasa fenecida,
Não reacende e, permanece, apagada; sem calor,
Pois, as cinzas que formam o seu jazigo, são frias
E, destituídas da paixão, quanto mais, do amor.

Mas, se o amor que sempre foi perene, recusa morrer
E, luta com altivez, para deixar de ser brasa morta.
Quanto mais, um antigo querer, que não se permite jazer,
Respira e vive e não se sente sufocado pela falsa derrota.

Assim, tenho um amor que se reavivou após um sono letárgico,
De uma eternidade que o fez sentir-se num braseiro gélido.
Ontem, uma brasa, dentre tantas outras, num coração famélico,

Hoje, uma brasa refulgente, ouvindo, dos lenhos, os estalos.
Para nós, as brasas são as estrelas que norteiam nosso amor
E, nunca, as cinzas enegrecidas: mortalhas de um triste desamor.


terça-feira, 11 de outubro de 2016

UM CORAÇÃO ANDARILHO


Tenho dentro do peito um coração andarilho,
Que não se conforma em ficar apático, inerte,
Enquanto, sente o sangue correr como um rio,
Tornando-o forte, estóico; um pétreo cerne.


Por mais que eu tente não consigo impedi-lo
De deixar o aconchego do peito e se aventurar
Pelas sendas desconhecidas de inóspitos caminhos
Em busca do amor verdadeiro; em busca do muito amar.

Sim, não posso colocar algemas naquele que crê,
Embora, saiba, que o amor, em sua plenitude é ficção.
Mas, não me é lícito destruir a crença sã e perene
Desse coração que se embrenha na luz e na escuridão.

Vá! vá e, quem sabe, encontrará o amor que nunca encontrei
Em lábios doces, porém, falsos de jura e "ais" mentirosos.
E, assim, que encontrares o coração gêmeo, se sentirá rei,
Mas,regresse, trazendo-o, para que eu tenha um porvir airoso.

Ontem, o meu coração saiu do peito em silêncio, na surdina,
Deixando-me ansioso pelo regresso com o sensual prêmio.
Vivi dias de incerteza e medo sem saber o que se antevia:
Era madrugada, quando ele se aninhou em seu eterno nicho.

Assim, que ele se acalmou, se recuperou da peregrinação,
Perguntei-lhe, angustiado, com a voz rouca; um gemido:
_ Querido coração, voltastes nu, para a nossa solidão.
_ Sim, e num esgar de dor disse: Continuarei, sempre, ANDARILHO!

domingo, 9 de outubro de 2016

A CARTA!


A tempestade se amainou;
A enxurrada se avolumou;
O céu voltou ao seu azul intenso;
As aves voltaram para suas revoadas...

A enxurrada descia com intrépidos a sarjeta suja;
O barro deslizava como serpente pela rua estreita;
Um gato rajado eriçou os pelos e pulou a sarjeta;
Um bêbado rodopiou como bailarino e caiu na lama.

A chuva, outrora, caudalosa; agora, apenas uma garoa;
O sol, uma mancha dourada, dentre as nuvens cinzentas;
Os passantes, passavam com os pés enlameados e frios;
A paisagem que se descortinou era um "Matisse".


No cimo do morro uma jovem soltou um barco na água turva;
O barco, no início, pareceu adernar e, sumir, nas vagas;
Um vento brando, salvou-o e o colocou firme, a navegar;
O bólido branco como uma pérola desceu a sarjeta em volteios.

Por um segundo, ou, uma eternidade para quem ama com loucura,
O barco, molhado, com as velas rotas, com o leme quebrado,
Chegou ao seu porto; o seu destino: as minhas mãos sôfregas.
Oh!, barco que em instantes se transmudou em uma carta de amor...

Pálido, encharcado pela tempestade, ajoelhei-me, na febril enxurrada,
E, febril, permiti que meus olhos esbugalhados, embaçados, a lessem,
Sim, a lessem, embora muitas palavras estivessem apagadas e ilegíveis,
Apenas garranchos, do que há pouco, foram símbolos belos e legíveis.

Palavras, garranchos... Uma mensagem que me fez desmaiar na enxurrada;
Uma declaração que me fez subir aos céus e me sentir um querubim;
Um consentimento que me fez arder em desejos e loucas seduções...
Lê-la, demorou uma eternidade e, quando cheguei ao final, urrei de felicidade:
" Querido, eu te amo e, quero ser tua, somente tua... para sempre, TUA!"

A enxurrada, não mais de águas sujas, mas, sim, de águas cristalinas,
Escorria com destino ao rio, ao mar, deixando-me o BARCO, a CARTA...
A enxurrada só secou, quando secaram as minhas lágrimas de felicidade.
Numa poça de água cristalina um pardal se banhava...





quarta-feira, 5 de outubro de 2016

A LAREIRA

A lareira mostrava-se nua aos meus olhos,
Que, enfeitiçados a contemplavam com fascínio:
Na câmara ardente fagulhas brotavam como sonhos
E, no meu âmago, brasas, avivavam, o meu martírio.

A noite ainda estava entreabrindo os olhos escuros,
Sorrateira em seu mistério de ocultar os temores,
Como se fora o túmulo frio, sujo e, abandonado,
Na campa tétrica: morada de almas penadas e silentes.

O lenho crepitava emitindo sons lamuriosos, doloridos,
Quando era beijado pelas chamas flamejantes e pegajosas.
Neste instante, de ti, eu lembrava os abraços fingidos
Que me enlaçavam e me queimavam: fogueira voluptuosa.

A lareira recebeu minhas lamúrias e decepções incontidas,
No fragor das labaredas que se agigantavam em estrépitos.
Era madrugada, quando só restaram brasas, da fogueira extinta;
Era madrugada, quando só restaram cinzas, dos meus anseios.


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