terça-feira, 28 de julho de 2015

A LAGARTIXA!

A lagartixa me fez feliz por um tempo e, infeliz, também, por um tempo.
Tudo aconteceu da maneira mais bizarra possível. Estava eu, entretido em assistir um filme faroeste estrelado por Allan Lad, na sala do meu pequeno apartamento, onde, já por um demasiado tempo morava sozinho , saboreando um saco de pipocas acompanhado de uma cerveja, quando, sem querer notar, notei uma lagartixa passeando despreocupadamente pelas alvas e nuas paredes (nunca gostei de quadros) à procura de alguns pernilongos para saciar a sua fome.  Curioso pelo animal que não me dava a mínima bola, despreguei os olhos do tubo de imagem e passei a seguí-la em seu vai e vem pelas faces escorregadias das paredes. Isto tudo durou o tmpo do filme, pois, cansado de virar e revirar os olhos em todas as direções acabei me cansando e adormeci no sofá. Noutro dia bem cedo, após tomar o café e me aprontar para o trabalho, curioso, procurei a lagartixa e, para minha surpresa, não a encontrei. Dando de ombros fui trabalhar.
À noite, coloquei um filme do James Bond, preparei a pipoca e a cerveja e me refestelei no sofá. Nem tinha chegado no meio do filme, quando a lagartixa irrompeu pela parede que ladeava a janela e, sem maiores esclarecimentos, se aproximou de mim e de um salto majestoso se aninhou no meu ombro. Estático, permaneci por uns minutos, com medo de fazer um gesto brusco e a assustasse. Assim, permanecemos até que o filme terminou. Quando delsiguie a TV, a lagartixa saiu num salto doido do meu ombro e foi passear pelas paredes. Por um instante fiquei a admirando e, confesso, neste momento passei a gostar do pequeno réptil.
No dia seguinte, ou melhor, na noite seguinte os fatos se repetiram. O que mudou foi o filme: estava assistindo Dr. Jivago. Agora já intimos, ao mesmo tempo em que saboreava uma pipoca, eu, com jeito, colocava um pedacinho na pequena boca do meu bichinho de estimação. Já não estava mais solitário no pequeno apê.
Assim, se passaram duas semanas. Sempre eu e a minha lagartixa assistindo filmes até madrugada alta. De uma coisa, eu tive de tomar providências: fechar todo dia ao sair, a janela, pois, um falcão peregrino já estava de olho na minha querida amiga. Uma noite, eu me lembro com saudade, ela, se aninhou no meu ombro e passou a me lamber o rosto; me acariciando com sua língua pegajosa. Outra vez, Oh, triste lembrança, eu a vi chorar quando a mocinha se despediu do mocinho no filme Suplício de uma Saudade e, chorou copiosamente ao ouvir a bela melodia.
Fomos felizes até que...
Até que, um dia ao sair atropeladamente de casa, atrasado para pegar o circular, esqueci de fechar a janela e, quando cheguei, constatei horrorizado de que a minha amada companheira tinha sido devorada pelo "maldito" falcão ( tinha várias penas no chão e alguns pedaços ensanguentados dela).
Por vários dias chorei a dor da perda e deixei de assistir os meus filmes prediletos. Sofri muito, pensei até em dar cobo da vida, mas...
Mas, a vida continuou para mim e um bela noite coloquei no vídeo o filme Janela Indiscreta e, me espreguicei no sofá, peguei o saco de pipocas e o copo de cerveja e iniciei a sessão. Tudo transcorria dentro da normalidade, quando sem mais nem menos, vi uma aranha passeando pelas paredes alvas e nuas. Tremendo de emoção, esperei pacientemente que ela viesse pousar em meu ombro (para quem mora sozinho qualquer alma vivente é um prêmio).
Durou três noites até que ela tomasse coragem e viesse me acariciar. Na janela fechada eu acreditava ver a figura do falcão peregrino, mas, desta vez, eu não ia cometer o mesmo erro. E, o inevitável aconteceu:  cansado de assistir os Dez Mandamentos, adormeci e, quando acordei senti uma dor angustiante no pescoço. Ao passar a mão senti os pelos eriçados da aranha que tinha cravado suas presas em minha jugular. Paralisado pela ação do veneno só pude ver o falcão peregrino bicando o vidro da janela... e, pensar, que ele poderia ter me salvo. Num último estertor, consegui pronunciar as minhas palavras finais:
" Saudade da minha doce lagartixa... Maldita aranha asquerosa e traiçoeira". Ouvi, ou não ouvi, que sei eu, do leito da morte, uma gargalhada que mais parecia sair da garganta de uma mulher.

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